O Brasil virou berço de grandes empresas globais. O que muda no mercado de trabalho com a formação das gigantes nacionais

As gigantes com certidão de nascimento brasileira estão se formando. No primeiro semestre deste ano, 44 fusões e aquisições ocorreram no Brasil. Essas transações, de acordo com a Associação Nacional dos Bancos de Investimento (Anbid), movimentaram 71 bilhões de reais. O número representa um recuo de 10% na comparação com o mesmo semestre de 2008, mas os nomes envolvidos recentemente impressionam. Sadia e Perdigão, JBS e Bertin, VCP e Aracruz, para citar alguns. Contando só cinco das operações do primeiro semestre, sozinhas representam 57% do volume total de negócios, o que revela o tamanho das companhias envolvidas. Somase a isso a união entre Itaú e Unibanco, no fi nal do ano passado, para formar um dos 20 maiores bancos do mundo, a compra do Real pelo Santander e a aquisição da Brasil Telecom pela Oi, no setor de telefonia. “Essas operações confi rmam a tendência que vem se concretizando ao longo dos últimos anos na formação de grandes organizações brasileiras, capazes de assumir a liderança e competir globalmente”, diz Carolina Lacerda, responsável pela subcomissão de fusões e aquisições da Anbid.

O capital nacional foi responsável por 59% das transações de compra de participações entre janeiro e julho de 2009, segundo levantamento da consultoria de gestão PricewaterhouseCoopers. Os setores de tecnologia da informação, alimentos e bancos foram os que mais fi zeram negócios nesse período. O cenário de titãs em que os profi ssionais terão de circular tem novas regras para as decisões de carreira, para a formação de salários e bônus e para as competências necessárias para crescer. Para o profi ssional, consolidação do mercado é sinônimo de maior competição: ao se unir, as empresas eliminam cargos redundantes, levando a enxugamentos e demissões. Para ter uma ideia, no primeiro semestre deste ano, Itaú Unibanco e Santander Real eliminaram 2 224 postos de trabalho no saldo entre contratados e demitidos. Isso representa uma diminuição, em seis meses, de 1,48% da base de 150 000 trabalhadores que esses dois bancos empregam. Entre 1 997 e 2004, o Itaú comprou oito instituições, que somavam 27 000 funcionários, mas, nesse mesmo período, 20 000 postos foram eliminados. “Quando duas ou mais empresas de grande porte se juntam, é ruim para os clientes, que fi cam com menos opções de serviços, e também para os profi ssionais, tanto das gigantes quanto das pequenas e médias, que terão um empregador a menos no mercado”, diz Marcelo Ferrari, diretor da Mercer, consultoria de recursos humanos com escritório em São Paulo (veja quadro Pesos e Medidas).

QUEM FICA
Os que permanecem após a fusão têm os privilégios dos escolhidos. Negociar salário pode fi car mais difícil, pois a chance de receber uma proposta da concorrência diminui com a consolidação da fusão, ainda que num primeiro momento as companhias se esforcem para manter quem lhes é essencial. No entanto, as empresas investem de outras formas em quem fi cou. Pode ser, por exemplo, bônus mais polpudo ou o patrocínio de um curso no exterior. “Aquilo que for necessário para reter o funcionário considerado importante”, diz Gilberto Guimarães, presidente da BPI no Brasil, empresa de gestão de recursos humanos com escritório em São Paulo. Esse retorno não costuma demorar a vir, pois um dos desafi os nas fusões é ser rápido. “O mais importante é diminuir ao máximo o tempo de integração, para evitar que se percam pessoas importantes”, diz Marcelo, da Mercer.

MOVIMENTOS INTERNOS
Durante a fusão, Itaú e Unibanco montaram uma célula na área de recrutamento e seleção para evitar des- > ® Régis Filho ligamentos importantes. O resultado foi que o RH trocou 2 000 pessoas de lugar dentro do próprio grupo, em um movimento forte para não perder talentos. Apesar dessas ações, empresas em momentos de fusão deixam gente boa escapar e, por isso, até mesmo quem sai pode ter novas perspectivas. André Lacaze, gerente de controladoria do Itaú Unibanco, trabalhava no BankBoston quando este foi absorvido pelo Itaú e viu a equipe passar por ansiedade e incertezas. 

“O medo de perder o emprego foi geral”, diz André. Muita gente não esperou para ver qual seria o futuro e aceitou propostas da concorrência só para pôr um fi m à angústia a respeito do que aconteceria com a equipe. André só deixou o posto por uma proposta de ganho 40% maior no Citibank. Um antigo chefe foi resgatá-lo e dois anos depois ele voltou ao Itaú, após a fusão com o Unibanco. Hoje, André considera que o mercado em que atua é composto de apenas três companhias: Itaú Unibanco, Santander e Bradesco. “Fora esses, são bancos menores, que não vão oferecer todas as oportunidades que tenho atualmente”, diz ele. “A empresa virou um mundo em si, com possibilidades de me movimentar por muitas áreas e níveis. Até há a possibilidade de expatriação para quem pensa em fazer carreira internacional.”
André Lacaze, gerente de controladoria do Itaú Unibanco: chances de fazer carreira similar em apenas mais dois concorrentes

QUEM ESTÁ FORA
Vale ter em mente também que as médias — e até grandes — que sobram nesse mercado de megaempresas estão se mexendo para enfrentar a nova concorrência. “Há companhias que fi cam de olho nos profi ssionais que gostariam de ter e não podiam contratar antes, mas que podem perder a vaga num momento de fusão e aceitar, fi nalmente, suas propostas”, diz Francisco Ramirez, da ARC, empresa de busca de executivos de São Paulo que participou da integração de 17 bancos nos últimos dois anos. “Quem fi - ca e quem sai não depende do talento apenas, mas se tem o perfi l adequado ao futuro da nova organização”, diz Francisco. Perfi l inclui também cultura e valores. 

Uma pesquisa da PricewaterhouseCoopers feita com 100 CEOs em diversos países mostrou que 25% dos gestores decidem sair da empresa em virtude da política adotada após uma fusão ou aquisição. Nas médias empresas, a remuneração costuma ser 15% menor que nas grandes, mas elas acenam, muitas vezes, com a possibilidade de fazer seus funcionários de sócios. “Há mais autonomia para tomar decisões, o que é um valor para muitos profi ssionais”, diz César Souza, presidente da Empreenda e consultor de gestão de pessoas em momentos de fusão.
Pesos e medidas
Como é a reação de cada público às fusões

Expectativa
• Funcionários querem melhores condições de trabalho e mais oportunidades de desenvolvimento e carreira.
• Clientes querem melhoria de serviços e atendimento.
• Investidores querem rentabilidade e valor de mercado.

Realidade
• Funcionários têm medo de perder o emprego, insegurança.
• Clientes são em maior número, mas nem sempre sentem uma melhoria nos serviços.
• Investidores percebem que o aumento de faturamento pode implicar menor rentabilidade e queda no valor das ações.
  Fonte: Portal Você S/A 

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