Estratégias vão de oferta de 16º salário a meio expediente no aniversário. Para consultores, ações econômicas podem manter profissional na empresa
Com a baixa taxa de desemprego no país, fica mais difícil encontrar profissionais qualificados no mercado e aumenta a preocupação dos empresários em manter seus talentos. Para segurar o time, pequenas e médias empresas, que concorrem com os grandes pacotes de benefícios oferecidos pelas maiores, têm criado estratégias que vão de oferecer 16º salário a alternativas mais econômicas, como churrasco uma vez por mês e meio expediente no dia do aniversário.
“Gente boa faz toda a diferença e todos sabem a dificuldade de encontrá-las no mercado”, diz Natasha Hazan, coordenadora do instituto Endeavor, de fomento ao empreendedorismo, no Rio de Janeiro. A especialista lembra que, de forma geral, a pequena empresa não consegue pagar um salário maior que o de empresas de grande porte, mas ações que não pedem alto investimento, como melhorar o ambiente de trabalho e dar possibilidade de crescimento ao funcionário, às vezes são suficientes para fazer o profissional pensar duas vezes antes de deixar a companhia.
Um dos sócios da empresa carioca do ramo de marketing Biruta Mídias Mirabolantes, Rafael Liporace de Souza Pereira, diz ter descoberto uma estratégia para retenção sem fazer altos investimentos. “Não quisemos fazer política baseada na questão financeira porque, além de as maiores empresas terem caixa e bolso maior, nem todo mundo trabalha só por motivo de dinheiro”, diz.
A empresa, que tem 60 funcionários, investe em políticas de retenção baseadas em pilares como bom ambiente de trabalho e cultura organizacional. Para isso, são oferecidos benefícios como espaços com sinuca, videogame, jogo de botão, shiatsu e até piscina para intervalos de descontração - ou inspiração - durante o trabalho, uma vez que a empresa precisa de um ambiente que inspire a criatividade da equipe, diz.
"Uma vez por mês a gente faz churrasco em volta da piscina”, afirma. Além disso, os funcionários trabalham só meio expediente no dia do próprio aniversário, no de casamento ou no do filho de até dez anos. “Medidas como essa só custam o meio expediente do profissional. Se estivesse na empresa, ele poderia não produzir, com a cabeça na festa do filho”, revela.
Para Pereira, contudo, entre outros motivos que seguram os talentos estão a possibilidade de desafios e de desenvolver o que aprendeu. O empresário comenta que, apesar de não conseguir praticar os salários mais altos do mercado, também não tem os piores, procurando oferecer algo em torno da média. “Sem remuneração factível, as pessoas saem do mesmo jeito”, diz.
Na Biruta, a meta de turnover (índice de rotatividade dos funcionários) foi estabelecida em 5%, mas o sócio afirma que ela tem se mantido entre 2% e 3%. Neste último ano, por conta do aquecimento econômico, ele afirma que todos os profissionais que perdeu foi por questões financeiras.
16º salário
Investir em premiação e bônus por desempenho é a estratégia que está sendo usada pela empresa de tecnologia i8, em Florianópolis, que conta com sete funcionários, entre eles dois estagiários. De acordo com Carlos Eduardo Penteado, um dos três sócios, os funcionários recebem até 16º salário, sendo que o último é o oferecido em prêmios.
“Há uma análise interna a cada três meses e os próprios profissionais avaliam o quanto merecem receber. Se ele teve 70% de aproveitamento, recebe mais 70% do salário”, explica. Penteado afirma que investe cerca de 40% a mais da folha de pagamento para oferecer o benefício que, segundo ele, retorna em produtividade para a empresa.
A i8 também optou por deixar a sexta-feira mais livre para que todos possam pesquisar sobre projetos extras de interesse. “Se tem alguma coisa que o funcionário quer fazer na empresa, ele tem a sexta para pesquisar sobre o assunto”, explica o empresário.
De acordo com Penteado, a retenção de talentos é vista como estratégica pela i8, que tem apenas um ano e meio de vida. “Estabelecemos a meta de que, se o funcionário se encaixar na empresa no período de dois anos, que ele fique dez, até mesmo pelo retrabalho que dá treinar novos profissionais”, afirma.
Falta mão de obra
De acordo com Reinaldo Messias, consultor do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas em São Paulo (Sebrae/SP), em período de aquecimento econômico é comum que menores empresas sejam fornecedoras de mão de obra para as grandes, o que exige do pequeno empresário atenção sobre políticas de retenção. “No passado, até funcionava aquela história do ‘manda quem pode, obedece quem tem juízo’, mas hoje, com a demanda aquecida, a necessidade por gente boa é maior e o mercado não tem essa mão de obra disponível."
De acordo com o Sebrae, 98% das empresas no Brasil são micro, pequenas e médias empresas, que são responsáveis por 56% dos empregos formalizados do país.
Para Messias, práticas seguras de retenção desses talentos estão voltadas à qualificação profissional e até mesmo bolsas de educação para filhos de funcionários.
Outra opção é oferecer ao talento uma pequena participação na empresa, que pode ser de 1%. “Dessa forma, o funcionário passa a integrar a empresa como dono e as remunerações podem vir maiores, compensando ficar pelo status de ser parte da organização”, diz. Entre outras medidas possíveis está até subsidiar parte da moradia para perto da empresa, em vez de pagar o vale transporte para quem mora longe. Para Messias, 5% da folha de pagamento podem ser destinados a ações como essas para, posteriormente, avaliar os ganhos e as carências existentes.
Profissionais especializados
A empresa Mobiliza, que oferece soluções tecnológicas também em Florianópolis, pretende começar, a partir deste ano, a oferecer auxílio para estudos. “Oferecer um salário maior é uma estratégia que a gente, como pequeno, não consegue”, diz o empresário Kornelius Hermann Eidam. O empresário disse que tenta conciliar o interesse profissional com o da empresa. “Nossos funcionários são programadores e designers. São profissionais especializados que têm sido procurados pelo mercado. É desafiador mantê-los”, diz.
Em São Paulo, o laboratório de patologia cirúrgica Diagnostika, que conta com cerca de cem funcionários, também tem realizado ações para diminuir a rotatividade anual, que tem girado em torno de 10%. “Cada profissional perdido é importante para nós porque ele é muito especializado e há carência no mercado”, diz o sócio-fundador Roberto El Ibrahim, que é médico patologista.
De acordo com Ibrahim, a empresa está trabalhando na construção de um plano de carreira que motive os funcionários tanto do ponto de vista profissional como de remuneração, com oferta de bônus por desempenho. Para Ibrahim, é importante oferecer possibilidades de crescimento e desenvolvimento aos profissionais, que são médicos e técnicos.
O proprietário da metalúrgica Thornnox Usinagem, Sérgio Alberto, disse que foi atrás de cursos gratuitos no Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai) para os seis funcionários da empresa. De acordo com Alberto, a empresa tem passado por dificuldades por conta de produtos vindos da China e a saída está sendo mudar um pouco o serviço prestado.
Para isso, a qualificação dos funcionários é importante, afirma. “Adquirimos uma máquina de tecnologia de ponta e temos funcionários que estão fazendo treinamentos”, diz. Alberto revela que já chegou a oferecer até 15º salário e, assim que a empresa passar pela crise, pretende voltar com o benefício como um prêmio. “A ferramenta mais importante que a empresa tem é o funcionário”, diz.
Fonte: Portal G1 / Economia