Saiba quais são os postos de trabalho que as empresas têm dificuldade em preencher e como se tornar elegível para ocupar um deles

Crédito: Tato Araújo

 - Crédito: Tato Araújo

Especialistas em recrutamento e gestores de recursos humanos dos mais diversos setores são praticamente unânimes em afi rmar que o mercado de trabalho brasileiro sofre com a escassez de profissionais qualificados. Levantamento realizado entre os meses de julho e setembro pela empresa de pesquisas H2R, em parceria com a VOCÊ S/A, mostra que, das 130 organizações ouvidas, todas disseram que têm dificuldade para preencher pelo menos um cargo. A pesquisa apontou que a falta de habilidade técnica é, de longe, o principal entrave para o preenchimento de determinadas posições. As competências emocionais e comportamentais, entretanto, são essenciais para a manutenção do emprego. O fator técnico foi apontado como problema número 1 por 57% dos entrevistados. Formação acadêmica veio em segundo lugar, com 23%. Em seguida, aparece a disputa por talentos versus a oferta de profissionais, com 19%. Idiomas e habilidades comportamentais vieram na sequência, com 12% e 11%, respectivamente.

O estudo também aponta alguns cenários regionais. Em São Paulo, o maior mercado de serviços especializados do país, as empresas sentem falta de técnicos qualificados com fluência em inglês ou espanhol, principalmente para preencher cargos de analistas e especialistas. No Rio de Janeiro e em Minas Gerais, no entanto, a dificuldade é preencher cargos executivos. Nas regiões Norte e Nordeste, há dificuldade para preencher cargos em praticamente todos os níveis. No Centro-Oeste, é mais difícil encontrar pessoas para diretoria. O Sul sofre com o mesmo problema e ainda precisa de técnicos. Engenheiros estão em falta em todas as regiões. Há menos profissionais formados em escolas renomadas de engenharia do que o mercado necessita. Segundo Rodrigo Forte, diretor executivo da empresa de recrutamento Michael Page, a escassez de profissionais qualificados ocorre porque as empresas estão cada vez mais exigentes. “Com a crise, elas entraram num movimento de troca da quantidade pela qualidade”, diz. Um dado da pesquisa feita pela H2R dá uma ideia do atual nível de exigência. Entre as empresas entrevistadas, 70% requerem que os analistas falem inglês. Dez por cento exigem fluência em espanhol. Os candidatos também devem ter curso de graduação, às vezes até MBA, e pelo menos dois ou três anos de experiência no cargo. O salário médio desses profissionais, de acordo com a pesquisa da H2R, não chega a 4 000 reais. Busca-se uma superqualificação para uma remuneração nem sempre equivalente.

Veja a seguir a descrição de dez áreas que as empresas têm dificuldade para preencher as vagas e conheça o perfil ideal para esses postos.

Advogado Trabalhista

Por muito tempo o advogado trabalhista foi considerado um dos menos sofisticados entre seus pares. Sua remuneração nunca foi equivalente à dos societários e dos tributaristas, por exemplo. Com a crise e a onda de demissões e reestruturações, no entanto, esse cenário mudou, principalmente para os trabalhistas que já tinham na manga o conhecimento do idioma inglês. Isso porque o mercado brasileiro passou a exigir profissionais que pudessem se reportar à matriz das empresas e explicar a elas como andavam as reestruturações e como funcionam nossos sistemas trabalhista e tributário. Segundo Rodrigo Forte, da Michael Page, a busca por profissionais com esse perfil quadruplicou nos últimos 12 meses.
Perfil: tem formação em Direto e trabalha normalmente no RH ou no jurídico.
Salário: o gerente da área trabalhista ganha entre 9 000 e 12 000 reais*.

Especialista em remuneração e benefícios
Geralmente, esse profissional é alguém que se destaca na área de RH por identificar formas de gerar economia na folha de pagamento ou por ter uma visão estratégica e criar planos de remuneração adequados para o objetivo do negócio. “No Brasil, há poucos profissionais qualificados para ocupar essa vaga”, diz Paulo Moraes, gerente da divisão Legal & Tax da empresa de recrutamento Hays, de São Paulo. “Quando o profissional tem de falar outro idioma para se reportar à matriz, a dificuldade de encontrá- lo é ainda maior”, afirma Rodrigo Forte, da consultoria Michael Page. Para ocupar esse cargo, é preciso mesclar conhecimentos de remuneração fixa e variável, legislação trabalhista e tributos sobre folha de pagamento. “O especialista precisa entender de que forma os benefícios oferecidos aos funcionários têm impacto no resultado financeiro e contábil da empresa”, diz Paulo Moraes.
Perfil: com formação em administração ou contabilidade, normalmente esse profissional vem do RH das empresas ou das consultorias especializadas no assunto. 
Salário: de 3 000 a 7 000 reais*. Profissionais com inglês fluente ganham mais.

Gestor Jurídico com visão de negócios
Hoje em dia, grandes empresas procuram gestores jurídicos que tomem decisões, busquem alternativas, entendam do negócio e conheçam os impactos do seu trabalho no resultado da companhia. “Eles são raros porque é um perfil muito diferente do formado nas universidades de Direito”, diz Paulo Moraes, da Hays. Um gestor jurídico tem de saber traduzir seus argumentos em números e entender o balanço da empresa, para falar com todos os níveis da organização.
Perfil: graduação em Direito e pós-graduação na área contábil ou financeira.
Salário: entre 9 000 e 15 000 reais*.

Gestor Jurídico - Até o jurídico vira negócio
Alessandra Schneider, de 38 anos, diretora jurídica da Dow Brasil, desde cedo se acostumou a ser a única advogada a participar de cursos de finanças e custos operacionais. “No começo, eu não entendia muito bem qual era a aplicabilidade daquilo”, diz. “Isso mudou quando comecei a participar das decisões estratégicas das empresas pelas quais passei.” Nesses treinamentos, ela aprendeu a avaliar riscos de modo concreto, apresentando números que serviam para apoiar o processo de decisão. Alessandra, que nasceu no Rio de Janeiro e logo foi morar em Curitiba (Paraná), onde passou praticamente a vida toda, estudou Direito na Universidade Federal do Paraná e fez mestrado na Alemanha. A grande virada de sua carreira, diz Alessandra, ocorreu quando ingressou na fabricante de pneus alemã Continental, em 2000. “Eu respondia para o presidente de uma das divisões da empresa. Ele me dizia que ou eu levava números, ou ele não conseguiria avaliar o que eu estava mostrando.” O aprendizado acelerou seu desenvolvimento. Em 2006, quando deixou a companhia, seu cargo já era de gerente jurídico de todas as unidades na América do Sul. Desde 2008, ela comanda a área jurídica da Dow Brasil. “É preciso fazer a gestão da sua área como um negócio”, diz.


Analista de planejamento tributário

Até pouco tempo atrás, o profissional da área tributária tinha um perfil conservador e não precisava ter visão estratégica nem proatividade. Há alguns anos, no entanto, a área fiscal vem ganhando destaque nas empresas por ser fonte de economia e, consequentemente, gerar aumento da margem de lucro do negócio. Como efeito, cresceu a demanda pelos profissionais que têm visão estratégica para detectar possibilidades de reduzir custos. Para isso, eles devem ter conhecimentos tanto de tributos diretos, do governo federal, quanto de tributos indiretos, dos governos estaduais. “Isso também é raro encontrar porque, normalmente, os profissionais se especializam em um ou em outro”, diz Paulo, da Hays. O processo de recrutamento de um profissional com esse perfil pode levar até três meses. Só para encontrar uma raridade dessas, as empresas especializadas em recrutamento levam até três semanas “A taxa de desemprego para que tem esse perfil é próxima de zero”, diz Paulo.
Perfil: formação em ciências contábeis e Direito. “Eles têm também muita visão financeira, de negócios e de processos”, diz Rodrigo Forte, da Michael Page. A carreira desse profissional começa normalmente em grandes consultorias.
Salário: entre 6 000 e 9 000 reais*.

 

Analista de desenvolvimento
Entre todos os cargos de analista, o de desenvolvimento de sistemas é o mais difícil de ser preenchido, é o que mostra a pesquisa da H2R. Embora haja profi ssionais qualificados tecnicamente, o mercado brasileiro sofre com a escassez de analistas com inglês fluente. “O Brasil tem fortalecido sua posição como um polo de desenvolvimento de software, mas nossos profi ssionais não estão preparados para trabalhar com equipes multinacionais”, diz Marcelo Braga, sócio da Search Consultoria em RH com escritórios em Salvador e São Paulo. Jovana Serra, gerente de recursos humanos da Dell, concorda. Na equipe de TI da fabricante de computadores, tem mais chances de conquistar uma vaga quem fala inglês fluentemente do que quem tem conhecimento técnico avançado. “Como nossos projetos são globais, é preciso interagir com pessoas de todo o mundo”, diz Jovana.
Perfil: além do conhecimento técnico em linguagens de programação, ter vivência no exterior é um diferencial valorizado. Fluência em inglês é, hoje, essencial.
Salário: um analista pleno ganha até 5 000 reais*, em média. O analista sênior alcança salário entre 9 000 e 10 000 reais*.

Analista de TI - Inglês que vale ouro
Rodrigo Cabral, de 29 anos, trabalha com tecnologia da informação desde os 20 anos, mas só viu sua carreira deslanchar depois de passar dois anos estudando inglês na Inglaterra, de 2005 a 2007. “Antes de viajar, eu trabalhava como desenvolvedor em empresas bem pequenas ou como autônomo”, diz. Desde o início de 2008, com inglês fluente na ponta da língua, Rodrigo foi contratado pela Dell. Apesar de ainda não ter concluído o curso de graduação em ciência da computação, que ele faz na Pontifícia Universidade Católica de Porto Alegre, Rodrigo já viu sua remuneração dobrar. Hoje, ele trabalha como analista no desenvolvimento do Dell Financial System e tem contato diário com profi ssionais da Ásia e dos Estados Unidos. Sem um bom inglês, esse trabalho remoto em equipe seria impossível. “Conhecimento técnico é fácil adquirir. O que fez a diferença na minha carreira foi a fluência em inglês.”

Controler

A busca por esse profissional vem se intensificando após o surgimento da Lei 11 638, que desde dezembro de 2007 obriga empresas com faturamento superior a 300 milhões de reais a ter padrões de contabilidade e de transparência nos números semelhantes aos das companhias de capital aberto. “Isso fez com que o mercado buscasse profissionais com formação mais parruda e sofisticada, como o controller, para assumir a responsabilidade”, diz Rodrigo, da Michael Page. O contador é um profissional mais operacional, já o controller ocupa uma posição mais estratégica, enxergando o negócio como um todo.
Perfil: formação em engenharia, contabilidade ou finanças.
Salário: varia de 15 000 a 18 000 reais*. A remuneração variável em algumas empresas alcança entre 4 e 10 salários adicionais.

Analista Contabil
Depois do escândalo da Enron (empresa americana de energia que faliu em 2001 em decorrência de fraudes fi nanceiras), a atenção para os procedimentos contábeis vem se intensifi cando continuamente. O antigo analista contábil, que tinha um trabalho interno e pouco se relacionava com outras áreas da empresa, passou a ter mais importância e teve de começar a se reportar diretamente à matriz. A transformação gerou uma corrida por profi ssionais da área que já falassem inglês fl uentemente e tivessem conhecimento das normas internacionais de contabilidade. Encontrá-los é uma missão árdua para especialistas em recrutamento e para o RH. “Eles são raros no mercado porque o profi ssional comum de contabilidade pouco se movimentou para acompanhar toda essa transformação dos últimos anos”, diz Paulo, da Hays.
Perfil: formação em ciências contábeis, inglês fluente e conhecimento de IFRS (normas internacionais de contabilidade). Instituições como Fundação Instituto de Pesquisas Contábeis, Atuariais e Financeiras e Trevisan Escola de Negócios, ambas de São Paulo, oferecem cursos específicos sobre o assunto.
Salário: entre 6 000 e 7 000 reais*. Dependendo da empresa, também recebe bônus. Segundo a Hays, esse profissional ganha até 2 salários adicionais na indústria e até 4 salários adicionais no segmento de serviços.

Gestor de Segurança do Trabalho
O profi ssional que administra e fiscaliza a segurança no meio industrial, organiza programas de prevenção de acidentes, elabora planos de gerenciamento de riscos ambientais, faz inspeções e emite laudos técnicos fi gura entre os mais procurados no levantamento da H2R. “Essa área e esses profi ssionais eram muito negligenciados pelas empresas”, diz Rodrigo Forte, diretor da Michael Page.“Na medida em que a legislação foi fi cando mais rígida, a necessidade de ter profissionais de primeira linha nesses cargos cresceu”, diz ele. O mercado não estava preparado para isso. Resultado: quem já tinha experiência e formação no assunto acabou sendo mais valorizado.
Perfil: formados em engenharia, arquitetura ou agronomia com especialização em engenharia de segurança. Em alguns casos, ele deve ter também especialização em meio ambiente.
Salário: com dois ou três anos de experiência, ele alcança salário de 7 000 reais*. Na alta gerência, ele chega a ganhar 15 000 reais*.

Engenheiro de segurança - Engenharia mais segura
Formado em engenharia sanitarista e ambiental pela Universidade Federal de Santa Catarina, Leandro Caldart, de 36 anos, decidiu fazer curso de especialização em engenharia de segurança do trabalho na Universidade do Estado de Santa Catarina, em 2003, quando começou a trabalhar na Amanco, fabricante de tubos e conexões — na época, ele atuava no departamento de meio ambiente. Depois da conclusão do curso, em 2005, Leandro logo foi promovido a engenheiro de saúde, segurança e meio ambiente. Não demorou nada e outra promoção chegou. Hoje, ele é coordenador da área de meio ambiente da Amanco. O curso de especialização rendeu a ele um aumento de nada menos que 150% na remuneração. Não são raros os assédios que ele recebe de outras empresas. Cheio de orgulho, ele conta que depois da implementação do sistema de gestão de saúde e segurança, em 2008, os indicadores de segurança da Amanco melhoraram significativamente. “Temos índice zero de acidentes”, diz Leandro.


Geólogo Sênior

Segundo Marcelo Braga, da Search Consultoria em Recursos Humanos, o Brasil vive uma escassez tremenda de geólogos experientes, principalmente nos mercados de mineração e energia. Isso acontece porque muitos dos profissionais mais qualificados optam pela segurança da carreira acadêmica. “Os recém-formados não atendem aos prérequisitos exigidos pelas companhias”, diz Marcelo. O geólogo é responsável por análise de solos e terrenos e pela elaboração de laudos que determinam muitas vezes a viabilidade de um projeto. Embora na maior parte dos casos siga carreira de especialista, muitas vezes esse profi ssional alcança remuneração superior à de cargos gerenciais. “Difi cilmente vamos encontrar um geólogo com cinco ou sete anos de experiência desempregado. O mercado sabe disso e o passe dessas pessoas acaba mais e mais valorizado”, diz Marcelo.
Perfil: a formação em geologia é essencial. Como esse profissional costuma estar envolvido em projetos gigantescos, a fluência em algum idioma estrangeiro, embora não seja obrigatória, pode ser um diferencial e tanto. “Hoje em dia, as empresas querem tanto o geólogo sênior que mal exigem que ele fale bem o português”, diz Marcelo, da Search.
Salário: de até 15 000 reais*.

Engenheiro Técnologo
De acordo com o levantamento da H2R, 32% dos entrevistados apontaram cargos de engenharia como os mais difíceis de serem preenchidos. Há um detalhe, entretanto, que deve ser observado. Quando falamos em escassez de engenheiros, estamos falando especialmente dos engenheiros que têm até três ou quatro anos de experiência, alto grau de conhecimento técnico e que se dispõem a acompanhar o dia a dia das obras e dos projetos. Na Alemanha, esses cargos seriam preenchidos por tecnólogos, e não por engenheiros com formação superior. “No Brasil, a formação de tecnólogos não se desenvolveu, então acabamos desperdiçando mão de obra muito qualifi cada para fazer esse trabalho”, diz Marcelo, da Search. A falta de glamour da função também ajuda a explicar o baixo interesse pela área. Muitos engenheiros não querem assumir essa função. “Engenheiros preparados para ocupar cargos gerenciais não são tão escassos no mercado”, afi rma Marcelo Braga.
Perfil: engenheiros com 3 ou 4 anos de experiência com bom conhecimento técnico.
Salário: de até 5 000 reais*, em média.

*Salários estimados para profissionais de médias   Fonte: Portal Você S/A  

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